A música “Expresso da Meia-Noite”, do grupo Racionais MC’s, apresenta uma narrativa poderosa sobre os efeitos do encarceramento e da exclusão social sobre o comportamento de jovens periféricos. Este artigo analisa a canção a partir dos pressupostos da Análise do Comportamento, com base no behaviorismo radical. O objetivo é identificar os impactos das contingências aversivas, do controle coercitivo e da privação de reforçadores sociais na formação e manutenção de padrões comportamentais disfuncionais. A metodologia empregada foi qualitativa, por meio da análise de conteúdo da letra da música, interpretando os comportamentos descritos sob a perspectiva funcional. Conclui-se que a obra evidencia um ambiente de controle negativo, ausência de reforçamento positivo e esquemas punitivos constantes, favorecendo o sofrimento psíquico e o enfraquecimento de repertórios operantes mais adaptativos.
A arte, especialmente a música, pode ser compreendida como uma forma de emissão verbal que expressa a história de reforçamento do indivíduo e de seu grupo social. No contexto do rap nacional, os Racionais MC’s apresentam, por meio de seus relatos musicais, os efeitos de contingências sociais adversas vivenciadas por sujeitos historicamente marginalizados. A canção “Expresso da Meia-Noite” retrata um ambiente prisional e suas consequências comportamentais, possibilitando uma análise funcional do sofrimento sob o paradigma do behaviorismo radical.
A música retrata um ambiente regido por contingências punitivas intensas e escassos reforçadores positivos. O comportamento do eu lírico é moldado por um histórico de controle coercitivo, caracterizado por punições físicas, ausência de reforço social e privação de condições mínimas de dignidade. Frases como “meu futuro é incerto” indicam a perda de controle sobre reforçadores futuros, condição que favorece quadros de desesperança e esquiva experiencial.
A generalização do medo e da vigilância constante são indicativos de uma história de punição sistemática, que enfraquece repertórios operantes mais adaptativos, como o planejamento de metas e a construção de vínculos sociais positivos. A ausência de reforçadores sociais (familiares, comunitários e institucionais) compromete o desenvolvimento de comportamentos pró-sociais, favorecendo respostas de agressividade, isolamento e sofrimento emocional.
A análise sugere que o comportamento do sujeito não é produto de um “eu” fragmentado, mas sim da história de interação entre o organismo e o ambiente, dentro de um contexto de contingências altamente restritivas e desumanizantes.
Conclusão
Expresso da Meia-Noite denuncia, sob forma de comportamento verbal artístico, os efeitos psíquicos e sociais de um ambiente controlado por contingências coercitivas. A música ilustra o impacto da privação, da punição e da ausência de reforçadores positivos na constituição de repertórios comportamentais marcados por sofrimento. À luz da Análise do Comportamento, compreende-se que o sujeito é produto de sua história de interações com o ambiente, e que mudanças sociais e culturais são fundamentais para alterar essas contingências. Políticas públicas que ampliem o acesso a reforçadores sociais, como educação, saúde e pertencimento, são essenciais para a construção de uma sociedade mais justa e menos punitiva.